Segunda-feira, 28 de Fevereiro de 2005
One, two, three, four.
Hoje é ao som de Christina Rosenvinge que escrevo esta página do diário de bordo. we will have a good life, we will have a good house in the countryside and we will spend there the summer time. Há um conforto inexplicável nesta canção. E não é só pelo facto de hoje estar um frio cane (-1º mais precisamente) e a ideia do Verão ser um suave bálsamo. O tom coloquial da sua voz parece trautear um daqueles monólogos non sense deliciosos, que tantas vezes andam cá dentro perdidos, oscilando ao sabor de uma alegria aguda de viver, sem explicação satisfatória. O mundo somos nós!
Uma imagem: Caminhar desde a estação de Coimbra A, em direcção à Universidade, pela Couraça de Lisboa, de manhã bem cedo, num dia de céu azul cru, olhando o Mondego tranquilo, desde o seu aceno ao abraço a Coimbra na Ponte de Santa Clara. Desde Love Burns até "White palms" dos Black Rebel Motorcycle Club (entretanto já se chegou à universidade).
Regresso à Christina Rosenvinge, para aguçar a curiosidade dos leitores e potenciais ouvintes
. espero. Rezam as crónicas que esta donzela de sangue duplamente real, fruto do cruzamento dos Reinos da Dinamarca e de Espanha, na sua adolescência encheu estádios de futebol na América do Sul, enquanto parte dupla Alex y Christina (sim, receio que seja algo do género
). Entretanto, depois de uma experiência mística (lirismo do carteiro), converteu-se à indie norte-americana, vivendo em Nova York. E, claro, como não podia deixar de ser, já esteve em Portugal (no entanto, não posso assegurar que tenha proferido a frase mágica: I love Portugal), fazendo a primeira parte dos Sonic Youth, no último concerto desta banda. Merece pelo menos um postal, não acham?
Sábado, 26 de Fevereiro de 2005
Primeiro artigo
Começar por onde? O melhor é não começar.
Nunca escrevi um diário, nem sequer me interesso por aí além pela internet ou coisas afins. Mas há uma coisa que sempre gostei de fazer: escrever cartas. Pensando bem, não é só escrever cartas, é também o ritual de enviar e receber cartas.
Um ritual...
Não consigo deixar de recordar uma das coisas mais interessantes que aconteceu quando andava no secundário, o ritual das cartas! Este é um daqueles momentos em que um sorriso percorre a distância do passado.
Não sei quem começou ou como é que começou, mas isso, aliás como normalmente acontece, não é o mais importante. Durante o secundário, eu e os meus amigos tinhamos um ritual de escrever cartas entre nós. Sim, um ritual é a palavra adequada, à qual junto sagrado, sem explicar porque. Era sem dúvida curioso, passavamos o tempo todos juntos na escola, falavamos imenso, partilhavamos imensas coisas, mas depois havia uma carta!
Todos trocavamos cartas entre nós, a maior parte das vezes, entregues em mão, com uma cumplicidade inexplicavél.
Havia uma regra que mais do que imposta era implicitamente aceite por todos, o conteúdo era inviolável. Pelo que sei, essa regra foi sempre respeitada, ao limite.
Nessas cartas, existia um novo universo e imaginário. Uma comunhão profunda daquilo que eramos, embora essas cartas não se limitassem a ser um confessionário ou um cemitério de segredos pós-adolescentes. Eram laços de palavras, pedaços de vida, sonhos e pesadelos confiados nas mãos de alguém que nos devolvia nas suas palavras um mistério profundo. Era algo que começava e terminva nas palavras confiadas nessas singelas cartas.
Tenho cerca de 100 cartas guardadas religiosamente desse tempo.
Actualmente o meu contacto com esses meus amigos do secundário é praticamente reduzido a alguns telefonemas anuais, tirando pontais excepções de fugazes reencontros. Algumas dessas pessoas não vejo nem falo com elas há anos.
Mas o sentimento sagrado permanece inviolável.
Serve esta introdução de interlúdio a este blog. Será a metáfora do carteiro.
Benvindos!